Publicado fevereiro 17, 2015 por STP com 0 comentários

Cinema Marcelo da Veiga

Marcelo Veiga nasceu em 1892, em São Tomé e Príncipe. Estudou em Lisboa e passou um tempo lá, mas voltou a São Tomé, onde ele era proprietário de terra. Ele não era muito conhecido até que Alfredo Margarido o incluiu na obra por ele organizada e publicada, Poetas de S. Tomé e Príncipe (1963). Ele também foi um sinal de negritude ao se expressar com seus poemas e isso não ocorre apenas com São Tomé, mas também com a África como um todo.

NOVA LIRA – CANÇÃO

Quem embarcou no porão
Fechado a sete chaves,
Apertado entre traves,
Sem ver sol sem ver a lua?
Foi o preto!
Quem deixou a terra,
-Filho ingrato que fugiu
ao pai e à mãe que não mais viu,
para ir acabar como um cão?
Foi o preto!
Quem a mata derrubou,
E cavou e semeou
E co’a sua mão de bruto
Cuidou, recolheu o fruto?
Foi o preto!
Quem fez o ‘senhor’– o patrão;
Lhe tirou da vida aflita
Lhe deu senhora bonita
E importância e situação?
Foi o preto!

Marcelo Veiga, in: Poetas de São Tomé e Príncipe (1963)
Será que antes havia pessoas que preocupavam mais com a cultura Santomense ou nós que não sabemos cuidar das belas e antigas obras.

Se Deus criou as pessoas para amar, e as coisas para cuidar. Por que amamos as coisas e usamos as pessoas!

Pelo visto esta teoria não esta sendo usada neste património.



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Publicado fevereiro 15, 2015 por STP com 0 comentários

Antigo Liceu D. João II


Atualmente conhecido como Escola Secundaria Patrice Lumumba.

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Publicado fevereiro 13, 2015 por STP com 0 comentários

Francisco José Tenreiro: Vida e Obra



Francisco José Tenreiro nasceu em São Tomé e Príncipe em 1921 e faleceu em 1963, numa altura em que se intensificava a Guerra Colonial. Geógrafo por formação, usou a poesia para exprimir a nova África, já não a dos postais ilustrados e dos povos, plantas e animais exóticos, mas a de um novo tempo, marcado pela fusão de culturas nativas.

Veio para Lisboa ainda bastante novo, numa altura em que nos Estados Unidos e na França se ouviam as novas vozes dos intelectuais negros a reclamarem os direitos e a proclamarem a identidade dos povos africanos. Tenreiro enquadra-se nesta corrente. Também ele viveu para exaltar a cultura da sua terra natal, se bem que não renegando certos valores adquiridos com a colonização. Por isso, mais do que o poeta da negritude, assume uma postura de defesa de todas as minorias étnicas, como é visível no poema “Negro de Todo o Mundo”. A sua poesia exalta o homem africano na sua globalidade, ou seja, a diáspora africana que se propagou por todos os cantos do mundo.

Publicou a sua primeira obra – Ilha de Nome Santo – na coleção Coimbra “Novo Cancioneiro”, integrando-se na corrente neorrealista que então surgia em Portugal. Poeta da mestiçagem, do cruzamento de culturas e de vozes, escreve, na “Canção do Mestiço”, “nasci do negro e do branco / e quem olhar para mim / é como se olhasse / para um tabuleiro de xadrez”, continuando “E tenho no peito uma alma grande, / uma alma feita de adição”. É nessa adição que reside a diferença. Tenreiro não apela a um retorno às origens africanas, mas ao respeito das pessoas de todas as cores, de todas as tradições. A sua voz é verdadeiramente a voz do exílio, por um lado, e do entrecruzamento das culturas e das raças, por outro.

Em 1953, juntamente com o angolano Mário de Andrade, publica, em Lisboa, Poesia Negra de Expressão Portuguesa, uma antologia de textos de novos intelectuais africanos. O próprio nome era já provocação: a africanidade implicava a desestruturação da portugalidade, o que, numa época de ditadura, era no mínimo arriscado fazer. É a busca de uma nova consciência africana.
Em 1962, Tenreiro concluiu o seu segundo livro de poesia, Coração em África, que já não viu publicado, por ter falecido no ano seguinte (in Infopédia, Porto Editora).

Considerado o primeiro poeta da Negritude de língua portuguesa, Ilha de Nome Santo é, porém, poesia eminentemente insular, não obstante os “3 poemas soltos” cuja estética está em consonância com a dos poemas dos anos 1950, revitalizadores de figuras, signos e símbolos emblemáticos do mundo negro-africano e vinculados aos modelos tutelares da consciência negra nos Estados Unidos, Cuba ou Haiti e redimensionados pelo movimento da Negritude. Assim, tal como os “3 poemas soltos”, incluídos em Ilha de Nome Santo, a saber “Epopeia”, “Exortação” e “Negro de todo o Mundo”, os poemas negros de Coração em África evocam, para estigmatizar, a desagregação e a dispersão absoluta do povo negro, a tristeza, a melancolia e a martirizada submissão do negro da diáspora. Expressão pungente das realidades do mundo negro-africano, esses aspetos conjugam-se com a dimensão do orgulho da raça, da exaltação cultural expressa pelo invocacionismo das entidades simbolicamente apreendidas como genésicas e cosmogónicas (Mãe-Terra/Tellus) e pelo evocacionismo ancestral, configurado no retorno às origens e na conceção reducionista da vida, em forma de esperança e certeza, aliás uma dimensão configuradora da estética negra.

Na 2ª parte de Coração em África, o poeta “regressa” à sua ilha: fizera um percurso desde Ilha de Nome Santo, em que o desejo de conhecimento das realidades e de identificação com aterra natal (que a dedicatória, primeiro, e, depois, o poema “A canção do mestiço” sintetizam) o leva a perscrutar as especificidades sociais e culturais da ilha, numa escrita neorrealista cujo funcionamento ideológico revela uma dimensão nacionalista pelas suas intenções anticoloniais. Nomeara em Ilha de Nome Santo a exploração colonial e a precariedade social da população nativa, em “Cancioneiro” e no “Ciclo do Álcool”, a identidade mestiça do ilhéu (por vezes uma dolorosa mestiçagem, como na poesia do “Romanceiro”), subvertendo o código do exotismo literário ao textualizar “realidades miúdas da vida do homem” para, após um mergulho no universalismo negro, que começara em “3 poemas soltos” e continuaria na primeira parte de Coração em África, regressar à pulsão da tellus insular. Os poemas dessa segunda parte, intitulada “Regresso à ilha”, maioritariamente escritos durante uma estada em São Tomé, naPáscoa de 1962, relevam do evocacionismo da terra natal, das suas potencialidades naturais e culturais, mas também espirituais, revalorizando-as através da citação dos seus frutos, animais, paisagens, ritmos e sensações, num gesto de imersão na tellus que o poeta realiza convocando os seus mais atávicos afetos; mas ainda assim, nunca esquecendo as tensões sociais, em última instância coloniais (Inocência Mata, “Marcelo de Veiga e Francisco José Tenreiro” in Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa, vol. 64, Pires Laranjeira, Lisboa, Universidade Aberta, 1995, p. 339).

A africanidade é, ainda, essa voz poética que privilegia o amor e a humanidade do homem africano, enquanto tal, sem cedências às emoções sensuais e rituais que, embora definidoras duma África tradicional, já não são mais miticamente olhadas. Privilegia também a África do nosso tempo na sua multivalência, onde a tradição e a modernidade convivem, aceitando as realidades que a história nela plantou regadas embora pelo sangue de milhões dos seus filhos. Realidades que a inspiração poética de Tenreiro traduziu melhor no seu segundo livro — Coração em África —, deixado pronto para publicação que a morte não lhe permitiu ver, e onde em poemas, marcados por uma escrita da modernidade sem, todavia, prescindir da característica estrutura narrativa própria da textualidade negra-africana, tais como “Amor de África”, “Mãos” e “Coração em África”, o poeta nos apresenta a força do seu estilo irónico, por vezes mesmo sarcástico, e agressivamente dialógico, onde a estética jamais fica prejudicada pela mensagem social que os textos veiculam.

UM POETA DA AFRICANITUDE

A africanidade, em Francisco José Tenreiro, é, por fim, uma atitude poética e filosófica, donde a raça e a cor, por si, não têm a valorização absoluta que a negritude lhes confere, preferindo-se, antes, considerar o homem como um ser universal, onde conta mais a alma, a essência, do que a pigmentação da epiderme, porque o poeta sabe que o amor e a maldade são acrómicos. E, assim, o poeta pode cantar a sua mátria, nesse extraordinário poema que é “Nós, Mãe” e de que respigo esta expressiva passagem:

Ah! Brancos, negros e mestiços
escaldaram o teu corpo de sensações
com o bafo quente de um vulcão maldito.
E os teus seios secaram
o teu corpo mirrou
e as pernas engrossaram
enraizando-se no teu próprio corpo.

E os teus olhos...

Os teus olhos perderam o brilho
ao sentirem o chicote
rasgar as carnes duras dos teus filhos.
Os teus olhos são poços de água pálida,
porque cheiraste na velha cubata
o odor intenso de uma aguardente qualquer.
Os teus olhos tornaram-se vermelhos
quando brancos, negros e mestiços instigados
pelo álcool
pelo chicote
pelo ódio
se empenharam em lutas fratricidas
e se danaram pelo mundo.

E a ti,
Oh! mãe de negros e mestiços e avô de brancos!
ficou-te esse jeito
de te perderes na beira de algum caminho
e te sentares de cabeça pendida
cachimbando e cuspindo para os lados.

Mas os teus filhos não morreram, negra velha,
que eu oiço um rio de almas reluzentes
cantando: nós não nascemos num dia sem sol!
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